Por:Danielle
Novidades
May 2015
Juliana Nakamura
Embora ainda seja incipiente, a utilização do Building Information Modeling (BIM) pelas construtoras brasileiras aos poucos avança em sofisticação, indo além de funcionalidades como a geração de modelos virtuais tridimensionais e a possibilidade de verificação de interferências nos projetos (clash detection). A evolução aponta principalmente para a integração com as ferramentas de planejamento, o chamado BIM 4D. Nele, às três dimensões espaciais que compõem o modelo 3D, é acrescida a variável tempo, tornando-se possível incorporar ao modelo informações sobre cronograma, sequência de obra e fases de implantação. Paralelamente surgem iniciativas que visam a aproximar o BIM dos canteiros, para que informações obtidas junto às frentes de trabalho, sejam de progresso ou de atraso de atividade, possam automaticamente municiar as equipes de planejamento, facilitando a tomada de decisão sobre as intervenções necessárias, gerando mínimo impacto nos cronogramas. Também ocorrem simultaneamente experiências em direção ao BIM 5D, que integra às outras variáveis o custo, permitindo que o modelo seja utilizado para gerar quantitativos e orçamentos.
“A ideia é vincularmos as informações dos componentes que representam o escopo do projeto às informações de planejamento e custo. Isto nos dá mais precisão sobre a quantidade de cada serviço a ser executada, permite a simulação de cenários e nos auxilia na definição do planejamento”, explica Joyce Delatorre, coordenadora do Núcleo BIM da Método Engenharia. “Com estas informações integradas, se tivermos qualquer alteração de projeto, conseguimos rastrear o impacto no prazo e no custo da obra, auxiliando na tomada de decisão”, continua a engenheira.
Ao permitir visualizar virtualmente e mais facilmente a progressão da obra, espera- se que o BIM integrado ao planejamento gere controles mais assertivos sobre os prazos de execução. Fernando Augusto Corrêa da Silva, diretor da Sinco, explica que tal precisão decorre principalmente da maior confiabilidade das informações do modelo e da possibilidade oferecida às equipes de planejamento de explorar diversas formas de executar a obra, escolhendo entre as opções existentes a melhor estratégia de ação.
“Além disso, diferente do que ocorre tradicionalmente, decisões que provavelmente seriam tomadas num segundo momento são antecipadas para a etapa de projetos. É o caso da logística interna do canteiro e de simulações de conflitos entre serviços”, compara Diogo Linhares de Camargo, sócio-diretor da Porto Camargo, construtora e incorporadora paranaense que utiliza, pela primeira vez, o BIM 5D (que também inclui a variável custo) na construção de um edifício residencial em Curitiba. Ele conta que simulações subsidiaram a tomada de algumas decisões, como a definição da quantidade de operários para a realização das atividades, a definição da sequência de execução das obras, o estudo de logística de canteiro, e até as análises de custos das soluções para fachadas.
Uso seletivo
Integrar o BIM ao planejamento pode induzir ganhos consideráveis para quem utiliza sistemas construtivos pré-fabricados e trabalha com prazos de execução exíguos. “Em obras com alto grau de industrialização, como as que fazemos, a modelagem tem um importante papel no dimensionamento e na operação dos equipamentos de movimateria mentação e também ajuda a programar com mais precisão a entrega dos pré-fabricados”, comenta Marcelo Pulcinelli, diretor de engenharia da Matec.
Ele conta que o BIM é utilizado em função da complexidade do projeto em questão na Matec. “Um galpão simples pode não justificar o investimento em uma modelagem completa. Ou corre-se o risco de a obra ficar pronta antes do modelo. Já em outros projetos, os ganhos podem ser enormes com a modelagem dos trechos de maior criticidade e com maior grau de interferências”, explica, citando como exemplo edifícios com alta densidade de instalações prediais.
Thais Mazziotti Salomão de Paula, coordenadora de Projetos da Odebrecht Realizações Imobiliárias (OR), reforça que a utilização do BIM 4D pode ser bastante flexível. Segundo ela, é possível utilizar a metodologia para fazer modelos bem simples e simular o plano de ataque da obra de modo geral, ou para elaborar modelos mais detalhados para simular o ataque a uma etapa específica, como, por exemplo, a vedação.
Sintonia fina
Para que tudo isso funcione, não basta construir uma sofisticada base tecnológica com um pool de softwares e licenças. As equipes de projeto, planejamento e orçamento precisam trabalhar de forma integrada. Eis o primeiro grande desafio para a maioria das construtoras.
Na Camargo Corrêa Desenvolvimento Imobiliário (CCDI), a necessidade de integração levou a empresa a rever todos os processos internos das equipes envolvidas (planejamento, orçamento, engenharia). “Isso porque o que cada equipe faz hoje é diferente do que fazia antes. Não basta mais fazer só para a sua área. É preciso pensar no conjunto”, explica Luiz Augusto Lervolino Pereira, diretor de Engenharia e Sistemas de Gestão da CCDI.
O grande desafio, explica Thais de Paula, é que, para haver a integração efetiva, os modelos não podem ser produzidos de modo aleatório. Eles precisam conter uma série de informações qualificadas demandadas pelo software de planejamento para a produção de gráficos e cronogramas. Na OR isso foi equacionado após meses de muita conversa e reuniões, antes de se iniciarem as modelagens.
Ferramentas permitem extrair informações do modelo produzido em 3D para gerar planilhas e gráficos que vão municiar as equipes de planejamento e orçamento |
É fundamental, portanto, que o projeto nasça modelado de forma a atender às necessidades das etapas posteriores, no caso, do planejamento e do orçamento. “As equipes de projetos devem estar totalmente aderidas ao processo executivo da construtora”, reforça Fernando Corrêa da Silva, lembrando que, quanto mais o modelo refletir sua execução, maior será o sucesso de sua aplicação.
Outra barreira que gradativamente vem sendo superada é a tecnológica. Desenvolver projetos em BIM exige a interoperabilidade de um conjunto de softwares e aplicativos. Na CCDI, onde o BIM é a base de operação para as áreas de planejamento, orçamento, suprimentos, gestão de contratos e controle da qualidade, trabalham conjuntamente nove softwares de mercado, além de um sistema (ERP) próprio que funciona como centralizador, tradutor e intérprete.
Diante de múltiplas tecnologias, o caminho escolhido por muitas empresas foi utilizar o Industry Foundation Classes (IFC) e exportadores diretos entre as ferramentas. Joyce Delatorre, da Método, conta que boa parte das informações são facilmente compartilhadas entre os sistemas. Porém, ainda há perdas de informação com o IFC. “Para contornar isso, definimos diretrizes de modelagem para garantir o uso apenas de componentes auditados. Todo modelo BIM, desenvolvido internamente ou pelos projetistas, passa pelo nosso controle da qualidade interno para garantir a confiabilidade dos dados”, revela.
Se por um lado há esses desafios, um facilitador importante é a aderência e o entusiasmo dos profissionais, sobretudo dos recém-formados, em relação à nova tecnologia. “Mas isso não exclui a necessidade de investirmos em capacitação para uso da metodologia BIM, que envolve novos fluxos e relações de trabalho”, salienta Delatorre.
Questões importantes ao planejar com BIM
Fonte: Adaptado do Manual de BIM: Um Guia de Modelagem da Informação da Construção para Arquitetos, Engenheiros, Gerentes, Construtores e Incorporadores, de Chuck Eastman et al. (Editora Bookman, 2014)
Fluxos de produção
Ainda que o BIM possibilite visualizar a execução da obra e permita o estudo de várias alternativas, a metodologia sozinha não fará mágicas no planejamento. A afirmação é do engenheiro Leonardo Manzione, diretor da Coordenar e professor de cursos de MBA da Fundação Getulio Vargas (FGV) e da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP).
A extração de informações do modelo, como quantitativos de materiais, é um dos recursos que podem ser explorados na plataforma BIM
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Modelo 4D pode ser associado ao uso de tablets pelos engenheiros residentes, seja para o acompanhamento da obra, seja para atualizar a evolução do cronograma |
Manzione cita estudos do professor Carlos Formoso, da Universidade Federal do Rio Grande do sul (UFRGS), que revelaram que somente 30% do tempo de uma obra é utilizado para os processos produtivos. Os outros 70% são desperdiçados em processos que não agregam valor diretamente, como fluxos logísticos, atividades de inspeção, retrabalhos e fluxos de informação (o tempo que as pessoas perdem para saber o que, quando e como fazer as coisas).
“Esse conjunto de atividades não agregadoras ainda não é contemplado nos softwares de 4D, pois o paradigma que eles utilizam é a reprodução do cronograma de Gantt associado com os objetos BIM”, comenta Manzione, que enxerga impactos positivos do BIM na medida que a capacitação da equipe de planejamento e de obra, trabalhando juntas, consigam desenvolver um projeto do sistema de produção, onde os fluxos de materiais e de transportes sejam visualizados com o apoio do modelo 3D.
Para isso, as ferramentas disponíveis podem oferecer diferentes abordagens. “Mas o planejador, qualquer que seja a ferramenta escolhida, tem a oportunidade de planejar e visualizar o layout do canteiro de produção da obra e, a partir daí, planejar e otimizar os fluxos logísticos organizando as atividades por seu fluxo de valor, não apenas pela sua sequência cronológica”, conclui Manzione.
BIM 4D na prática
Visualização
Ao combinar um modelo 3D com sua evolução ao longo do tempo, o BIM 4D apresenta a sequência executiva de forma mais eficiente do que com um diagrama de Gantt tradicional.
Contribuição de partes interessadas
Por ser visualmente mais acessível, o modelo 4D facilita a troca de informações e de contribuições de agentes menos familiarizados com a engenharia e o planejamento.
Logística do canteiro
O modelo permite prever as melhores áreas de armazenamento de materiais, acessos ao canteiro, posicionamento de grandes equipamentos etc.
Coordenação da mão de obra
O modelo 4D facilita dimensionar e coordenar o fluxo de trabalho das equipes de mão de obra, inclusive em espaços pequenos.
Plano de ataque
O modelo 4D permite avaliar e comparar os diferentes cenários de planos de ataque e programações de serviço. Durante a execução, permite controlar melhor se o projeto está em dia ou atrasado.
Cinco obras planejadas com BIM
Projeto colaborativo
Composto por dez edificações em uma área de 80 mil m², o complexo multiuso Parque da Cidade, construído pela Odebrecht Realizações Imobiliárias (OR), está utilizando o BIM de diferentes maneiras. Os projetos das Glebas B e C do empreendimento foram produzidos exclusivamente em BIM, e o modelo 3D foi integrado aos softwares de planejamento e de extração de quantitativos. O trabalho envolveu diferentes equipes da construtora por cerca de um ano. “Um dos desafios foi ajustar o modelo produzido pelos projetistas para atender às necessidades do software de planejamento”, conta Thais M. Salomão de Paula, coordenadora de projetos do Parque da Cidade (Glebas B e C) da OR. Ela conta que, como a modelagem começou ainda na etapa de anteprojeto, o BIM agregou agilidade para a equipe de produção realizar o planejamento de logística e dos elementos do canteiro.
Ganhos identificados
– Agilidade na extração de quantitativos
– Possibilidade de visualização do processo executivo
– Maior assertividade no planejamento e rapidez nas revisões de projeto
Aspectos a aperfeiçoar
– Alinhamento de linguagem entre os diferentes agentes. O modelo 3D precisa ser produzido conforme as necessidades das etapas e equipes subsequentes (planejamento, execução etc.)
– O desenvolvimento de bibliotecas ainda demanda muitas horas-homem
Jurubatuba Empresarial Local: São Bernardo do Campo (SP) Ano de construção: 2014 Construtora: Camargo Corrêa Desenvolvimento Imobiliário Softwares utilizados: software próprio + pacote de nove softwares, entre eles, BIM Field 360, Revit, Navisworks (Autodesk) e Primavera (Verano) |
BIM no canteiro
Em caráter piloto, a Camargo Corrêa Desenvolvimento Imobiliário (CCDI) vem testando um sistema para integrar sede, escritório e canteiro por meio de uma plataforma BIM. Nas obras do Jurubatuba Empresarial, o engenheiro da obra, com o apoio de um tablet, pode carregar informações do modelo 3D pelo canteiro e introduzir dados recém-extraídos na obra para municiar as equipes de planejamento. A informação pode ser desde um dado sobre o progresso de um serviço ou a detecção de alguma dificuldade em trecho que exigirá a colocação de outra frente de serviço. “Desde o início do trabalho percebemos que a assertividade e a velocidade da tomada de decisão ficaram maiores”, diz o engenheiro Luiz Augusto Lervolino Pereira, diretor de Engenharia e Sistemas de Gestão da CCDI.
Ganhos identificados
– Informações mais acessíveis e com atualizações sincronizadas entre escritório e canteiro
– Maior agilidade para a tomada de decisão pela equipe de planejamento
– Melhor rastreabilidade do controle da qualidade, que antes era feito em papelMelhor rastreabilidade do controle da qualidade, que antes era feito em papel
Aspectos a aperfeiçoar
– Infraestrutura para tráfego de dados e estabilidade da rede
– Interação entre os diferentes softwares
– Capacitação das equipes de produção
Produção enxuta
Fábrica da BMW Local: Araquari (SC) Ano de construção: 2014/2015 Construção: Perville Gerenciamento e fiscalização: Concremat Softwares e aplicativos utilizados: Revit, Syncro, Team Member, Primavera (Oracle) |
Com uma área total de 1,5 milhão de metros quadrados, a obra da fábrica da BMW em Araquari (SC) combinou as metodologias Lean Construction e BIM. A modelagem 4D foi utilizada na análise de possíveis problemas de construção ainda na fase de modelagem virtual. Ivo Shimoide, coordenador de novas tecnologias da Concremat Engenharia, conta que o BIM 4D foi útil também para acompanhar a produção dos pré-fabricados, cruciais para a evolução da obra. Por meio da representação gráfica, era possível saber se o elemento estrutural estava em produção (se aparecia transparente no modelo 3D) ou se estava pronto para a montagem (se aparecia cinza), desencadeando toda a logística necessária para as etapas seguintes. A obra utilizou, também, um aplicativo que permitia atualizar o status e o cronograma da obra remotamente por meio de tablets.
Ganhos identificados
– Maior assertividade na elaboração do planejamento
– Visualização gráfica de diferentes possibilidades de programação e planejamento
– Atualização constante do cronograma
Aspectos a aperfeiçoar
– Comunicação entre departamentos e processos
– Interação entre as ferramentas
Planejamento integrado
O Verum Mooca é composto por 108 unidades residenciais distribuídas em torre única. Fernando Corrêa da Silva, diretor da Sinco, conta que as informações IFC oriundas dos diversos softwares de projetos de arquitetura e estrutura foram importadas sem maiores problemas pelo software de planejamento. “A solução permitiu melhor controle visual da obra, comparando o previsto e o realizado. Isso mudou a dinâmica das reuniões de controle mensais da diretoria com as obras, por exemplo”, comenta. No Verum Mooca o BIM foi utilizado, entre outras funções, para simular etapas de execução, subsidiar o planejamento da logística do canteiro e extrair quantitativos.
Ganhos identificados
– Melhor visualização do planejamento e compreensão das relações entre as atividades
– Confiabilidade das informações do modelo
– Maior assertividade no acompanhamento e no replanejamento
Aspectos a aperfeiçoar
– Acompanhamento junto à produção (gestão de mão de obra e de material)
– Ajustes nas curvas de balanço, de forma a permitir a visualização da produção do novo plano de ataque, associada a um novo custo gerado
Alpha Sigma Towers Local: São Paulo Ano de construção: 2013-2016 Construtora: Brookfield Incorporações Arquitetura: Botti & Rubin Consultoria: Leonardo Manzione/ Coordenar Consultoria de Ação Softwares utilizados: Solibri Model Checker, Autodesk Revit, MS Project; Synchro |
Complexidade geométrica
O conjunto Alpha Sigma Towers, em construção na zona Sul de São Paulo, é um empreendimento multiuso de grande porte, formado por duas torres – Torre Alpha (30 pavimentos) e Torre Sigma (28 pavimentos) – de geometria complexa, com pilares inclinados e lajes de dimensões variáveis. Para entender melhor o processo construtivo, a Brookfield Incorporações decidiu criar uma versão em BIM com ajuda do consultor Leonardo Manzione. Em cerca de três meses, o edifício virtual foi concebido e o modelo associado ao planejamento já feito em MS Project. A partir daí, a visualização de cada etapa da obra ficou mais clara, permitindo à equipe de planejamento otimizar alguns aspectos da proposta original. Segundo Gabriel Meneghin, superintendente de Construção da Brookfield Incorporações, a solução ajudou, por exemplo, na escolha do melhor método executivo de escoramento e reescoramento. “O BIM permite fazer um orçamento mais assertivo, e a construtora estuda a possibilidade de implementar a ferramenta em projetos futuros”, afirma Meneghin.
Ganhos identificados
– Melhor visualização do processo de construção
– Melhor acompanhamento do cronograma de obras
– Antecipação de problemas de interferências entre as disciplinas
Aspectos a aperfeiçoar
– Melhoria da sinergia do projeto com o planejamento de custos, visando à maior assertividade do orçamento do projeto
– Contribuição de equipes de execução na elaboração do planejamento